terça-feira, 30 de julho de 2019

Derrubada durante a cheia da semana passada, toda a fachada da casa de Lucicleide Maria da Silva, 45, é sustentada apenas por uma estaca de madeira mal fincada no chão. No quintal, às margens do rio Beberibe, foi descartada a cama que ela usava, em meio ao amontoado de lixo que toma conta do canal. “Minha geladeira não pega mais. Minha estante virou com tudo, televisão, conversor. Acabou”, lamentava a dona de casa, contabilizando as perdas que sofreu com a chuva. Lucicleide mora com seis filhos, oito netos e um dos genros na comunidade do Jacarezinho, entre os bairros do Porto da Madeira, no Recife, e São Benedito, em Olinda. Ali é possível constatar um dos aspectos mais alarmantes quando se fala dos alagamentos na Região Metropolitana: o acúmulo de lixo nos canais, que torna possível até andar sobre eles. Na última quarta-feira, durante o temporal que deixou 12 mortos e centenas de desabrigados, os rejeitos despejados no rio subiram junto com a água que invadiu as casas localizadas nas margens.



Derrubada durante a cheia da semana passada, toda a fachada da casa de Lucicleide Maria da Silva, 45, é sustentada apenas por uma estaca de madeira mal fincada no chão. No quintal, às margens do rio Beberibe, foi descartada a cama que ela usava, em meio ao amontoado de lixo que toma conta do canal. “Minha geladeira não pega mais. Minha estante virou com tudo, televisão, conversor. Acabou”, lamentava a dona de casa, contabilizando as perdas que sofreu com a chuva.

Lucicleide mora com seis filhos, oito netos e um dos genros na comunidade do Jacarezinho, entre os bairros do Porto da Madeira, no Recife, e São Benedito, em Olinda. Ali é possível constatar um dos aspectos mais alarmantes quando se fala dos alagamentos na Região Metropolitana: o acúmulo de lixo nos canais, que torna possível até andar sobre eles. Na última quarta-feira, durante o temporal que deixou 12 mortos e centenas de desabrigados, os rejeitos despejados no rio subiram junto com a água que invadiu as casas localizadas nas margens.

A família teve que sair da casa às pressas. “Foi por volta das três da manhã. Minha mãe acordou com a cama flutuando. Uma vizinha que mora no pé da ponte desocupou um barraco e nos ajudou”, conta uma das filhas de Lucicleide, Josineide Paulo da Silva, 24. Só voltaram no domingo, quando a água baixou. “Toda a imundície que estava no rio veio para cá. Isso que você vê é mais lixo que se acumulou depois”, observa. Ela diz que também é comum ver jacaré subindo a margem para “tomar banho de sol”.

A questão do lixo é um dos principais problemas urbanos em cidades como Olinda, onde, segundo a prefeitura, são coletadas 14 mil toneladas por mês. Na Capital, esse número chega a cerca de 30 mil toneladas, de acordo com a Empresa de Manutenção e Limpeza Urbana (Emlurb). Para a professora de Impacto Ambiental Soraya El-Deir, da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), apesar de cobrir quase todos os bairros, a coleta não é suficiente para o volume de resíduos produzidos nos centros urbanos. “Não há uma lógica gerencial para pegar 100% do que é resíduo, ou seja, tudo aquilo que é descartado, mas tem potencial para ser reciclado”, comenta.

Pesquisadora na área de Gestão de Resíduos Sólidos, ela defende uma política de conscientização ambiental e valorização dos rios, em que a população seja incentivada a descartar os resíduos da forma correta. “[Muitos moradores] não têm o conhecimento suficiente para compreender a importância de fazer a separação do lixo molhado do seco, papel, papelão, lata, vidro, isopor, e destinar para a coleta seletiva”, explica. A professora cita ainda que em países como a Alemanha, há centros de coleta e reciclagem específicos para cada tipo de resíduo. “Aqui a população joga o lixo onde é mais fácil, na porta de casa, no córrego”, diz.

Respostas
Em nota, a Prefeitura de Olinda informou que a comunidade do Jacarezinho pertence ao Recife, mas que vai enviar uma equipe ao local até sexta-feira para averiguar se o trecho do Rio Beberibe fica na cidade. O texto ressaltou ainda que o poder público está realizando um grande mutirão de limpeza de entulhos e retirada de lixo, priorizando as áreas afetadas pelas chuvas.

Também por meio de nota, a Prefeitura do Recife disse que o serviço de coleta cobre 100% do município, inclusive nas áreas de difícil acesso, com fiscais em todos os bairros. Já em relação à coleta seletiva, em que há separação de resíduos, a Prefeitura informou que o serviço é promovido em 62 bairros, com 67 pontos de entrega voluntária (PEV), e que em 2018 foram coletadas mais de 2,7 mil toneladas de material reciclável.

A Secretaria de Infraestrutura e Recursos Hídricos de Pernambuco (Seinfra-PE) explica que, de acordo com a Lei 12.305/2010, responsável por instituir a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o recolhimento dos resíduos sólidos é de responsabilidade dos municípios.

Ao Governo do Estado compete o trabalho de dragagem do rio. No entanto, por entender a importância do corpo hídrico para o meio ambiente e para a qualidade de vida das pessoas, a Seinfra informa que entrará em contato com a Prefeitura de Olinda no sentido de articular um trabalho em conjunto voltado para melhorar a situação do Rio Beberibe.
  
"Tiro carne do lixo", diz moradora“Tudo isso aqui veio do lixo”, conta a dona de casa Mary Romão, 66, também moradora do Jacarezinho, apontando para os produtos que mantém guardados em um pequeno armário, entre latas, panelas e garrafas. É dos rejeitos do rio Beberibe que ela sobrevive. “Até a carne, eu tiro os ‘caldo’ e como. Meu menino [filho] cria porco e vai buscar lavagem, eu tiro e a gente come”, revela, com o neto Arthur, de 1 ano, no braço.

Mãe de 15 filhos - três deles já falecidos -, ela mora ainda com outros dois netos, um de 3 anos e o outro de 11 anos, além de Arthur. Na noite da chuva, Mary diz que acordou toda molhada. “Minhas pernas estavam entrevadas e a água veio com tudo”, lembra. Quando a cheia começou, saiu com as crianças para a casa de um dos filhos, também na comunidade, mas numa área que não foi atingida.

A água danificou tudo o que tinha, mesa, armário, roupas, colchão, e o chão se encheu de lama. Agora, espera passar o período de chuvas para reorganizar o espaço e voltar para casa. Também conta com a ajuda de familiares. “Minha menina [filha] me deu umas panelas”, relata.

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