Em abril de 2016, o Canal do Panamá terá sua estrutura ampliada. Um fato que modificará as rotas do comércio internacional e abrirá oportunidades para o principal porto pernambucano. Agora Suape está prestes a fazer uma jogada no xadrez das transações marítimas: consolidar-se como um hub port, isto é, um porto concentrador. Assim, receberia grandes navios cargueiros provenientes principalmente da Ásia, que passariam pelo Canal do Panamá. De Pernambuco eles repassariam a carga para navios de dimensões menores, os quais a redistribuiriam para outras localidades.
Um cenário que aponta para um crescimento de 9,5% do desempenho do porto ao ano até 2031, segundo dados do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Assumindo esse papel, o complexo industrial e portuário turbinaria também a atração de novos players industriais e abriria caminhos para a elevação das exportações locais. Mas realizar esse xeque-mate demanda estratégia governamental e protagonismo da iniciativa privada.
Hoje, 5% do comércio internacional passa pelos 80 km do Canal do Panamá, que faz a ligação entre os oceanos Pacífico e Atlântico. Um movimento que não é maior porque o canal não acompanhou as mudanças nas transações marítimas que passaram a ter navios de grandes proporções, que não podem trafegar no local em razão da baixa profundidade.
De acordo com o consultor Sérgio Kano, ex-presidente do Tecon Suape (terminal de contêineres), a maioria das cargas que chega hoje ao Brasil do continente asiático trafega pelo Cabo da Boa Esperança, no continente africano. Embora o Canal do Panamá seja a rota mais rápida e menos dispendiosa, ela apresenta, no entanto, restrições porque não comporta navios de grandes proporções. A partir de 2016, porém, o canal permitirá o trânsito de embarcações com até 14 mil TEUs (a unidade que representa a capacidade de carga de um contentor marítimo padrão). Antes, sua capacidade era de até 4,5 mil TEUs. “Quando o canal foi construído não se imaginava que os navios teriam capacidade de contêineres que possuem hoje. Mas houve um grande desenvolvimento do comércio marítimo nas últimas décadas”, explica Kano.
A espera de oito anos de obras se aproxima do fim. Em operação, a nova capacidade permitirá duplicar a quantidade de cargas transportadas. Para os especialistas, essa reestruturação poderá mudar significativamente os fluxos do comércio internacional, reduzindo o tempo das viagens e o custo da operação logística, principalmente pelo ganho de escala.
Uma redefinição que interessa muito ao Norte e Nordeste do Brasil, que geograficamente estão mais próximos do istmo caribenho. E, em especial, ao Estado de Pernambuco.
Além da inversão dessa rota, um novo elemento deverá beneficiar um ou mais de um porto no Norte ou Nordeste. A maioria dos portos brasileiros não tem capacidade de receber os novos cargueiros de grandes dimensões, sendo necessário a circulação das embarcações via um hub port (porto concentrador). E a partir dele a distribuição para os destinos finais através de embarcações de menor porte. “Em Suape, temos uma estrutura privilegiada que nos permite receber as linhas de comércio marítimo de longo curso, fruto de investimento de qualificação de R$ 2,2 bilhões entre 2007 e 2014. Ao ser revisado, o Porto de Suape já previu a implantação de profundidade que comportaria esses novos navios em operação. Essa carga é quebrada e embarcada para os demais portos que não têm capacidade de receber os grandes navios”, informa o diretor de gestão portuária de Suape, Paulo Coimbra.
No ano passado, o Porto de Suape movimentou 418 mil TEUs – 15,2 milhões de toneladas de cargas, superando em 20% o desempenho de 2013. Com as oportunidades vindas da ampliação do Canal do Panamá, a estimativa da gestão do porto é de seguir crescendo numa média de 10% ao ano até 2030. Atualmente, operando apenas com o Tecon Suape (terminal de contêineres), a capacidade de movimentação de cargas é de 700 mil TEUs por ano. “Esse terminal ainda opera com certa folga, quase o dobro da demanda atual. Mas, com o crescimento da economia brasileira nos próximos anos e as mudanças de algumas concepções logísticas, como o Canal do Panamá, vejo a necessidade a médio ou longo prazo do Tecon II”, avalia Sérgio Kano.
Mesmo partindo na frente na concorrência com outros portos no Norte e Nordeste no quesito infraestrutura, o Complexo Portuário Industrial de Suape segue recebendo recursos. O Programa de Investimento em Logística (PIL) do Governo Federal, anunciado no início de junho, contemplou o porto pernambucano com seis novos terminais: o Tecon II, o terminal de veículos, o terminal de grãos, dois terminais de granéis minerais e um terminal de uso privado, para o Estaleiro Vard Promar. Esses empreendimentos somam um total de R$ 2,35 bilhões, que deverão ser licitados no primeiro semestre de 2016.
Os investimentos são altos, pois o salto em infraestrutura para entrar nessa rota global é necessário. Não adianta o Porto de Suape apenas ser melhor que seus concorrentes, que segundo a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) seriam Pecém (Ceará), Itaqui (Maranhão) e Vila do Conde (Pará). “Melhoria da infraestrutura e superestrutura portuária, acesso terrestre do porto às áreas produtoras e consumidoras, maior desenvolvimento da região de forma a aumentar o valor agregado das cargas, diminuição da burocracia no despacho aduaneiro, marco legal estável, tarifas competitivas e agilidade na movimentação são requisitos para a constituição de um porto concentrador", aponta o gerente de Estudos e Desempenho Portuária da Antaq, Fernando Serra.
"A impressão do setor é de que os portos brasileiros do Norte e Nordeste - regiões que mais se beneficiariam pela proximidade geográfica com o canal - não possuem, atualmente, infraestrutura adequada, nem produtividade satisfatória para receber tais navios de forma competitiva” acrescenta. Ele exemplifica que alguns terminais chegam a apresentar índices de movimentação de 10 a 11 contêineres por hora, enquanto o padrão de produtividade de terminais usados como hub ultrapassa os 100 movimentos por hora.
O atendimento a essas condições levantadas pelo especialista contribuem para a redução do custo médio do movimento de cargas. Do contrário, os portos perdem competitividade, reduzindo a possibilidade de se beneficiarem da expansão do Canal do Panamá. Apesar da impressão nada positiva que o mercado tem sobre a região, o gerente da Antaq destacou o porto pernambucano. “Por estarem no território brasileiro, minimizando distâncias, portos como o de Suape poderiam ser pivô de um novo triângulo de comércio marítimo internacional, ligando-se com os portos do Caribe e Europa. Nesse cenário, poderiam ser concentradores de cargas oriundas, por exemplo, dos Estados Unidos ou Europa e distribuidores, via cabotagem, dessas cargas para os demais mercados internos brasileiros", analisa Serra. "No caminho inverso, poderiam se constituir em pontos importantes de exportações brasileiras, com destino aos mercados do leste asiático ou da costa oeste americana”, destaca.
Ele menciona que os concorrentes de Suape precisariam melhorar a infraestrutura de acesso terrestre e marítimo, além de se modernizarem para competir por cargas transportados do comércio exterior.
EXPORTAÇÕES
EXPORTAÇÕES
Além de aquecer a movimentação do porto, o hub tem capacidade de atrair mais investimentos industriais para o Estado, estimular as exportações e multiplicar os empregos na área de logística. “Esse movimento se irradia, pois um porto concentrador de cargas é emissor e receptor para outros países e Estados não apenas via cabotagem, mas por trens, carretas, caminhões. Quanto maior é a movimentação nas rodovias e ferrovias, maior é a criação de empregos e necessidade de mais investimentos em logística para a região”, projeta Sérgio Kano.
Outra vantagem é o aumento no número de empregos no setor industrial. Isto porque, segundo diretor de planejamento e gestão de Suape, Jaime Alheiros, um hub port estimula a instalação de novas fábricas. “A atividade logística não é grande geradora de mão de obra, porém, o aquecimento desse segmento e a existência de rotas regulares de longo curso e cabotagem, com origem e destino em grandes mercados internacionais, favorecem a atração de novos empreendimentos para as zonas industriais do Complexo de Suape”.
Alheiros destaca ainda o momento de alta no dólar que é favorável para a exportação. Logo, a tendência é que haja ainda mais investimentos fabris no Estado visando também o mercado internacional. “Uma vez criada a rota, é uma via de mão dupla. Realizamos inclusive reuniões com o objetivo de incentivar e viabilizar que empresas locais, que não são grandes exportadoras, possam aproveitar essa oportunidade. Mas, não é apenas Pernambuco que exportará a partir desse canal de embarque de volta para a Ásia”, comenta Alheiros.
Um dos fatores que favorece a competitividade das exportações por essa rota é a redução de até sete dias de viagem para os portos asiáticos, segundo a Antaq. Outro ponto que poderia estimular a exportação de produtos pernambucanos seria a criação de um serviço conjunto de vários armadores. A iniciativa reduziria os custos de transporte de carga e poderia viabilizar por exemplo, a exportação de frutas do Nordeste para a Ásia por via marítima. "Esses fatos se alinham com a ideia de que, se a tarifa do Canal do Panamá expandido puder ser diluída pela maior quantidade de TEUs por embarcação em cada passagem, de forma a gerar economia por contêiner, então o uso do canal pode se tornar uma opção vantajosa para acessar os portos do Extremo Oriente. Uma situação que abre novos mercados para os produtos das regiões Norte e Nordeste”, aponta Fernando Serra.
Para o sócio-diretor da Ceplan Consultoria e professor de economia da Unicap, Valdeci Monteiro, a consolidação de Suape como hub port abre importante possibilidade de Pernambuco ampliar sua relação comercial com a Ásia e os Estados da costa oeste americana, a exemplo da Califórnia. Dessa forma, o Estado seria inserido no principal mercado exportador e importador mundial. “Há potencial de exportarmos tanto produtos já tradicionais de nossa pauta exportadora, como o açúcar da Zona da Mata e as frutas do São Francisco, bem como os setores emergentes das áreas de petróleo e automotivo. Mas, sobretudo abre espaço para ampliação das exportações de micro e pequenas empresas de produtos variados, a exemplo do artesanato. Também sinaliza para ampliação da importação de componentes e matérias-primas que poderão ser adquiridos a preços mais competitivos", estima o economista. "Por outro lado"- alerta - "poderá ampliar a importação de mercadorias que podem concorrer com produtos locais, a exemplo do segmento de confecções”, ressalva.
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