sábado, 25 de julho de 2020

Professora de 69 anos ensina em sítio no Agreste de Pernambuco usando internet da vizinha: "cheguei a chorar"

Professora Maria José da Silva, 69 anos, ensina pelo WhatsApp (Reprodução de vídeo)

O ensino remoto é desafiador para qualquer professor, que precisa de mais tempo e dedicação para preparar as aulas e adaptá-las às tecnologias. Mas as dificuldades enfrentadas por educadores de grandes cidades são diferentes das que passam os professores do interior, principalmente em regiões mais pobres, como o Nordeste brasileiro.

Um exemplo disso é o caso de dona Maria José da Silva, de 69 anos, que é vinculada às secretarias de Educação dos municípios de Santa Cruz do Capibaribe e Taquaritinga do Norte, no Agreste de Pernambuco. Ela leciona há quase 20 anos e ensina aos alunos do 3º e 5º anos do ensino fundamental (cerca de 30 alunos em cada turma, incluindo alguns com necessidades especiais). Licenciada de uma das escolas, atualmente está ministrando aulas para apenas uma delas.

A professora mora com duas irmãs que integram o grupo de risco da covid-19, e desde que o novo coronavírus chegou ao estado, decidiu se refugiar com as duas em um sítio em Brejo da Madre de Deus, cidade próxima. 
"Eu moro em Santa Cruz e lá o bairro mais afetado [pela covid-19] é o nosso", contou. Ao saber que precisaria encontrar formas para dar aulas remotas aos alunos, Maria José ficou desesperada.
Como naturalmente ocorre com pessoas da idade dela, a professora não tem familiaridade com as novas tecnologias, e não sabia o que fazer para não deixar os alunos desassistidos. Ela chegou a pedir a instalação da internet na casa do sítio, mas por tratar-se de uma área rural, o provedor não conseguiu. A solução foi procurar a ajuda de uma vizinha, que tem internet na residência. Mesmo assim, tem problemas com o sinal, que cai sempre que chove. Os dados móveis também não funcionam.

Porém, para não atrapalhar a rotina da casa da vizinha, ela decidiu que ficaria do lado de fora, em um ponto em o sinal da rede sem fio (wi-fi) ainda funciona. Próximo a uma árvore, ela montou o espaço que seria seu "home office", às margens de uma estrada de terra: uma cadeira de balanço, um toldo improvisado para proteger do sol e um banco para apoio.

Maria José conta que chegou a entrar em contato com a secretaria dos municípios e se oferecer para pagar uma outra professora para fazer o trabalho. 
"No início eu me apavorei muito, cheguei a chorar. Foi difícil para mim, achei que não ia conseguir. Disseram que tinha que ser a professora da sala, que iam me ajudar. Me deram uma força muito grande", relembrou.
Aulas pelo WhatsApp

Como tem dificuldades para gravar vídeos, formato mais comum das aulas remotas, a professora decidiu que repassaria as explicações aos estudantes pelo WhatsApp. Das 8h às 12h, ela fica no espaço improvisado com os livros de conteúdo e cadernos de atividades, tirando fotos e enviando as explicações para as mães dos estudantes. Depois, aguarda os alunos responderem e corrige cada tarefa de casa individualmente. "Se eu mandasse as respostas eles não iam fazer", pontuou.

Mesmo à distância, a professora "puxa a orelha" dos estudantes que não participam das atividades, através das mães. Além disto, leva o conteúdo para ser entregue na escola, junto ao kit merenda. "Meu objetivo é atingir a todos, minha parte está sendo feita", afirma. A professora vê o acompanhamento próximo por parte dos pais e responsáveis como um ponto positivo da educação à distância. "Não é melhor do que presencial, porque eles precisam brincar, interagir com o coleguinha, da socialização. Mas é válido, sim, basta a gente querer".

Reconhecendo as dificuldades do ensino remoto, Maria José acredita que sem ele seria pior. 
"Me emocionei outro dia, toda vez no fim de uma atividade eu gosto de parabenizar o aluno, mesmo que ele erre, para que ele se sinta feliz [em estar aprendendo]. Ele disse: 'agradeço às suas aulas'. Ouvir isso de uma criança é muito valoroso. É importante a gente ver que abriu caminhos para alguém".
Da redação do Blog Vertentes Notícias 
Com informações do NE10 Interior

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